sábado, 1 de maio de 2021

COMANDANTE MARTINS E SILVA


Li agora que o Comandante Martins e Silva nos deixou de vez. Não esqueço, nosso instrutor de Educação Física na Escola Naval, oficial navegador da Sagres na nossa viagem de instrução em 1964. Alguns de nós ainda tivemos oportunidade de o ver Imediato na Sagres. Oficial distinto, Líder, Camarada e Amigo proferiu a aula majestática aquando os nossos 50 anos de entrada na Marinha.

À família as sentidas condolências. Que descanse em paz.

quinta-feira, 29 de abril de 2021

Samine. Balanta, guia e ladrão de vacas

 Para os Balantas da Guiné roubar gado, especialmente vacas, não é um acto vergonhoso, mas sim um acto de coragem, ainda mais valorizado, se não se for apanhado e não matar ninguém. Samine era um Balanta-Bravo, alto, magro, musculoso, orgulhoso, indisciplinado e corajoso. Para além de guia ao serviço do COP3, com uma G3 distribuída que mantinha sempre impecavelmente limpa, era um exímio e conhecido ladrão de gado.

Acompanhou o destacamento em várias operações. Era um guia conhecedor do terreno, eficiente e aguerrido, mas ficava sempre mais excitado e distraído da tarefa que estava a desempenhar quando sabia ou sentia que andavam vacas por perto. Nessas ocasiões parecia esquecer-se da direcção do objectivo para onde o Destacamento se devia dirigir e, instintivamente, seguia em direcção às vacas. Era preciso estar sempre muito atento ao comportamento do Samine quando o levávamos como guia. Se ele começava a mostrar muito entusiasmo ao abrir o caminho, a alargar o passo e a fazer desvios, tínhamos de olhar com muita atenção para a bussola e a carta sob o risco de irmos parar a um local onde se encontrava uma manada de vacas. Exprimia-se num crioulo muito particular em que a palavra que melhor conseguia fazer compreender era vaca. Mas era senhor de uma linguagem gestual muito expressiva.

Com o beneplácito ou o fechar de olhos do Comandante do COP 3, ia algumas vezes com um grupo de Balantas ao Senegal roubar vacas. O que fazia por lá nunca o cheguei a saber, mas quando chegava a Bigene com uma ou duas dezenas de vacas, vendia uma parte à companhia do Exército e descia depois a Ganturé para nos vender as que sobravam. Era um bom negócio para ele, para os seus balantas e também para nós.

Um dia convenceu o major a deixá-lo ir com o seu grupo à margem Sul apanhar umas vacas que andavam por perto das margens do rio Cacheu. O major pediu-nos ajuda para realizar a operação. Uma LDM e alguns botes com fuzileiros foram designados para essa missão. Lá os fomos largar a meio da noite e combinamos um ponto de recolha para a manhã do dia seguinte. E no local e hora combinada lá estavam o Samine, os seus balantas e umas duas dezenas de vacas junto à margem, à espera do embarque. Foi uma carga de trabalhos obrigar as vacas a entrar na água e subir a porta da LDM, onde só entraram à força, puxadas e empurradas. Como não couberam todas na LDM algumas tiveram de vir nos botes e aqui as coisas foram mais complicadas. As vacas tiveram de ser obrigadas a entrar na água e depois puxadas para dentro dos botes. Não gostaram, escoicearam e alguns fuzileiros foram parar à água. Uns botes acabaram por optar trazê-las a reboque, mas algumas vacas acabaram por morrer afogadas. Para as que escaparam, a explicação que os veteranos me deram e eu vou vendê-la exactamente pelo mesmo preço, é que as transportaram ao lado do bote, puxando-lhes o rabo para cima e mantendo o orifício traseiro fora de água. Segundo esta explicação as vacas não se afogam por lhes entrar água pela boca, mas sim pelo outro lado.

Achava piada ao Samine, ao seu jeito desenrascado e à forma ligeira, despreocupada e alegre como parecia encarar a vida. Numa das primeiras operações em que me serviu de guia, as indicações que deu até atingirmos o objectivo foram correctas. Depois de assaltarmos o objectivo, quando nos dirigíamos para o ponto de reembarque, comecei a aperceber-me que a direcção que seguíamos se desviava do ponto de reembarque que tinha definido. Chamei várias vezes a atenção do oficial que ia na frente da coluna para corrigir o rumo, mas o destacamento acabava sempre por se desviar do caminho que queria seguir. Por fim, já irritado com os desvios, mandei parar o destacamento e fui à frente ver o que se estava a passar. Acabei por perceber que, apesar das indicações constantes do oficial, o Samine se desviava sempre com a desculpa de que o caminho era melhor por ali. Falei com o Samine que, depois de algumas desculpas mais ou menos esfarrapadas, acabou por confessar, com um ar matreiro e sorridente, que ali, á frente, um pouco para a direita e perto do rio havia vacas. Como não havia grandes diferenças entre um percurso e o outro e não previa também reacções hostis por parte dos guerrilheiros que deviam andar por outros lados e com outros problemas para resolver, dei autorização ao Samine para passar pelo lugar onde estavam as vacas e comuniquei à LDM a mudança do ponto de reembarque.

Chegamos facilmente ao local onde se encontravam as vacas. O Samine e os seus balantas separaram rapidamente algumas para levarem. A situação acabou por se descontrolar um pouco porque também alguns fuzileiros resolveram mostrar a sua costela camponesa e não resistiram também capturar e encaminhar mais algumas vacas que agora engrossavam a nossa coluna.

O resto do percurso até ao reembarque na LDM, embora curto e sem percalços é dificilmente descritível tal a dificuldade em fazer com que as vacas avançassem de forma ordenada pela bolanha alagada e lodosa até ao local onde nos esperava a LDM. Aumentado com um considerável número de vacas indisciplinadas e barulhentas, retiradas à força do seu meio, pressentindo o que lhes viria a acontecer e que resistiam como podiam a cada passo que eram obrigadas a dar, o Destacamento desorganizou-se e aquilo que deveria ser uma coluna acabou por se transformar num conjunto de vários grupos a puxarem e empurrarem vacas para a margem do rio. Ainda hoje recordo as expressões de espanto do patrão e do pessoal da LDM, quando, finalmente, entrei a bordo com o pequeno grupo que tinha ficado para trás a montar segurança. Quanto a mim, pelo menos por uma horas, senti-me Balanta.

A divisão do espólio da operação não foi fácil. O Samine considerava que todas as vacas eram presas dele, mas o pessoal do Destacamento, eu incluído, também nos sentíamos com direito a uma parte do saque. Alguns fuzileiros tinham logo encaminhado uma vaquinha para junto do respectivo abrigo e lá a amarraram com toda a segurança. O cabo do rancho, que aparecera imediatamente na ponte-cais, reclamava também os seus direitos. O Samine protestava e queria receber a paga por todas a vacas recolhidas. Assumindo-me como parceiro no roubo das vacas, discuti longamente com o Samine o direito que nos assistia e acabamos por acordar numa divisão mais justa e equitativa do saque. Levou com ele para Bigene as vacas que lhe couberam e negociou-as com a companhia do Exército. Uma das nossas vacas oferecemo-la à guarnição da lancha para a compensar do trabalho e do estado em que tínhamos deixado o porão.

O Samine não teve um fim feliz. Um dia apareceu a caminhar em direcção à base vindo pela bolanha que nos servia de carreira de tiro, terreno que estava absolutamente interdito a qualquer passagem por ser provável lá se encontravam granadas e projécteis que não explodiam quando se experimentavam as armas. Apesar dos avisos, dos berros e gestos do pessoal que se encontrava por perto, para sair do local e mudar de direcção, continuou a caminhar para o aquartelamento agitando numa das mãos um objecto que tinha encontrado. De repente o objecto explodiu e o Samine desapareceu. Era, simplesmente, uma granada de bazuca que ele tinha encontrado meio enterrada no lodo.

domingo, 25 de abril de 2021

OCEANOS

 Nascido a 25 de Abril de 1944, comemora hoje os seus 77 anos o Vasco, Vasquinho, Leitão Rodrigues. OCeano que é bastante considerado pelos seus pares devido às suas qualidades. Óptimo Camarada e Amigo. Talvez o Oficial com mais tempo e experiência nas fragatas João Belo. Já retirado das lides navais teve que enfrentar uma grande borrasca que conseguiu vencer.

Um óptimo dia para ti com todos os teus e que o repitas muitas vezes com saúde e a tua boa disposição.

Um grande Abraço.

ABRIL