Postal de Goa (XVIII)
Porém, um outro aspecto peculiar da paisagem goesa são os inúmeros cruzeiros (crosses) que se encontram à beira das estradas, na margem dos rios, nos outeiros, nas várzeas e, cada vez mais, no interior das povoações e no pátio das casas. É difícil encontrar um local, urbano ou rural, onde não haja a presença de um cruzeiro que, tal como acontece com o tulôss hindu - um pequeno arbusto sagrado que cresce numa peanha - identificam a crença religiosa dos goeses e se integram harmoniosamente na paisagem.

Os cruzeiros apareceram em Goa, provavelmente em meados do século XVI, associados à cristianização e às suas práticas, quer por iniciativa das entidades religiosas que os colocavam nos adros das igrejas, quer por iniciativa individual ou da comunidade para cumprir promessas, para reconhecer e agradecer benesses divinas ou como forma de assinalar acontecimentos importantes na vida religiosa das comunidades. No entanto, a origem desta tradição cultural ainda não está suficientemente estudada.
Os cruzeiros tornaram-se, frequentemente, locais de culto e essa sua função mantém-se na actualidade, com a regular colocação de flores, velas ou oferendas, bem como a realização de missas e ladainhas, muitas vezes acompanhadas pela música de um violino. As práticas religiosas em Goa por vezes aglutinam símbolos de diferentes religiões e a devoção que os cruzeiros inspiram parece ultrapassar a comunidade cristã. De facto, vêem-se mulheres de sari junto dos cruzeiros, ao mesmo tempo que a tradição de colocar colares de flores nos cruzeiros é seguramente de inspiração hindu e pode ser observada na contínua peregrinação que atrai a Holly Cross de Bambolim, um dos mais venerados cruzeiros de Goa.

Hoje serão alguns milhares os cruzeiros dispersos pelo território de Goa e são uma atracção para os adeptos da fotografia.
Embora os que se encontram nos adros das igrejas sejam regularmente limpos e pintados, o tempo e o progresso terão destruído muitos dos mais antigos cruzeiros de inspiração popular e muitos outros terão sido deixados ao abandono.
No entanto, os cruzeiros continuam a manter o seu valor simbólico e multiplicaram-se com a evolução das técnicas de construção e com a possibilidade de acesso a novos materiais, tendo sido adoptados em larga escala pelos emigrantes goeses, que fazem as suas casas em Goa e passaram a colocar cruzeiros ou cruzes nos seus quintais e jardins.
Porém, para além do seu significado religioso, os cruzeiros são um elemento característico da paisagem goesa e são uma expressão eloquente de uma apurada expressão da arte popular, traduzida na originalidade de cada construção e na diversidade de formas e de materiais utilizados.